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Saga das Almas
A VOZ

I
Quem ousa vir tolher-me a liberdade?
Quem ousa influenciar-me a decisão?
Que Voz interna me impõe tal verdade,
Se trago em mim verdade na razão?
Que sabes dos anseios que acalento
P’ra aconselhar-me a deles desistir
Dizendo haver já vida aqui dentro
Mas desprezando a vida que há em mim?
Não quero, não preciso e não consinto
Eu posso, escolho e não vou aceitar
Que ordenes eu sufoque meu destino
Por causa de um ser que inda não há
Eu ‘entresinto’ a brisa da ventura
Nos campos da fortuna a me brindar
Destino que alcançarei segura
Sem nada nem ninguém a atrapalhar
Eu vou, eu sigo em frente e, destemida,
Afirmo aos céus e à terra: O corpo é meu!
Não abro mão de nada em minha vida
Decido agora: Não! Primeiro eu!
II
Tu vês? Não foi difícil. Já acabou!
Foi-se o problema e nada aconteceu
Nenhuma maldição cá me chegou
Alívio, enfim! Sigo o caminho meu.
. . .
Mil noites delirantes se passaram
Mil dias em que enriqueci na lida
Mil sonhos muito a muito conquistados
Me consumindo o tempo em euforia
Mas Voz do ontem volta e me busca
No hoje, sempre e sempre a me falar
Do ‘Não’, do dia, a maca, a morte brusca...
Respondo: é “interromper”, não é “matar”!
Cala tua voz! Não posso te escutar!
Já disse, não me coube alternativa
Ou era eu e o mundo a aventurar
Ou ele, atravessando a minha vida
Mais mil mantos da noite me chegaram
Quando Ventura abandonou-me os dias
Fortuna em punho, tudo conquistado
Mas nada que me dê sentido à vida.
Mas ... quantos anos mesmo ele teria?
E seu rostinho, a quem lembraria?
Aliás, “ele” ou “ela”? Uma menina!?
Eu até sei que nome escolheria
Recordações que me apunhalam a alma
Remorso em que afogo a alegria
Quisera eu volver àquela hora
E refazer a escolha, dar-te a vida...
Poder voltar à furna em hora e dia
Quando éter e Loucura te arrancaram
Fugir de lá contigo ao ventre ainda
E ter-te aqui, agora, a meu lado
E assim te embalar mil noite’ ao berço
Olhar-te e, em ti, achar minha ventura
Ouvir-te, rindo à toa em doce enlevo
Criar-te para o bem: minha fortuna
E repetir teu nome dia a dia
Viver por ti, não mais viver por mim
E ser tão mais feliz nessa tua vida
Do que na que ora morro em dor sem fim
Oh, Voz amiga, vem me consolar
Sou culpa condenada à maldição
Ensina como, então, me perdoar
Se o mal que fiz não merece perdão?
Eu perco as forças, eu quase desisto
Meu corpo curva ao tempo, esgotado
Vazio pelo choro nunca ouvido
E o som - “mamãe’ - nunca pronunciado
III
Oh, mãe, eu sou a Voz, sou teu rebento
Que exultava em ventre acolhedor
Que ansiava ao colo, ter teus beijos
Teus braços, tuas palavras de amor
Não vou mentir, confesso que sofri
Perder a vida foi perder a ti
Perder teus olhos, não poder seguir
Contigo ao lado, a cuidar de mim
Mas, mãe, por muito amar-te, eu te perdoo
E por te perdoar, quedei feliz
Sorve também do amparo que hoje sorvo
Te mostro o novo rumo a seguir:
Sente que o Universo te sustenta
Do mesmo modo que sustenta a mim
Te aconchegando ao peito, te aconselha
Ao recomeço em busca de outro fim
E acolhe a dor do arrependimento
Que te abre novas formas de escolher
Encara o erro em calma sem lamento
É queda que te leva a crescer
Te ergue à luta em novo caminho
Confia, ampara e ama sem pensar
Te oferta à Vida, estarei contigo
Que nova Vida te encontrará
Ama o que sofre e ama o que fere
E aos que não pedem, ama mesmo assim
O Amor perdoa muito mais que sete
Amor não julga, não condene a ti
Mesmo chorando, espalha teu sorriso
Mesmo em tristeza, sê consolação
Alerta aquelas que, qual tal contigo
Rejeitam o filho, filhas da ilusão
E a cada alegria a espalhar
E a cada nova dor que consolares
Verás florir-te a Vida a perdoar
E nossas almas se aproximarem.
(Samia Awada)


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Palavras-chave:
aborto, valorização da vida
